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RE: Uma história da Canção de Coimbra no decorrer do séc. XX (pt. 1)
Bem, @leodelara a resposta a cada uma das suas perguntas é uma tese de doutoramento! :D O Fado é uma questão muito complexa. Vamos por partes, tentarei ser objectivo:
- e 2. A história do fado "começa" mais ou menos no séc. XIX, em Portugal, nos arredores de Lisboa, sobretudo, mas acredito que também estivesse nos arredores da cidade do Porto. Porquê cidades? Porque era maioritariamente assistido e executado em bares e bordeis. Era uma forma de entretenimento urbana, muito associada aos considerados marginais da altura. Por isto, e apesar de se popularizar, no ínici o Estado Novo proibiu a sua execução publica, proibindo a própria guitarra portuguesa (isto, simplificando a história). Anos depois, o mesmo Estado Novo utiliza o Fado como simbolo identitário do país na promoção de Portugal no estrangeiro. O Fado voltou a ser diabolizado nos anos seguintes ao 25 de Abril, porque era associado ao Estado Novo. Hoje em dia voltou a ser utilizado e instrumentalizado como siímbolo nacional.
Ou seja, acho que respondi à sua questão. Sim, ele já foi reconhecido várias vezes, em contextos e com conotações muito diferentes (muitas vezes antagónicas).
- Como expliquei acima, o Fado é associado normalmente com o meio Urbano. Em Portugal do séc. XX destacou-se, ou fizeram por se destacar o Fado em Lisboa e em Coimbra. Depois de ouvir a Balada do V Ano Jurídico que publiquei no primeiro post, vá ouvir um fado de Lisboa e vai perceber as diferenças, por exemplo, na colocação da voz. O Fado de Coimbra tem uma entoação mais lírica e menos popular. Mas isto também depende do interprete e do tema. Também há quem diga que se tocava Fado na cidade do Porto, mas não com a promoção de símbolo identitário como foi em Lisboa ou em Coimbra.
- A resposta 1. já resume isso. Mas para a semana vou tentar expor um muito pequeno resumo da história do Fado (de Lisboa) para que percebam melhor. Pensei que tivessem mais familiarizados com o tema e anestes posts assumi, como é meu hábito, uma posição mais crítica sobre a ideia de Fado.
O Fado, meu caro Leo, muito mais do que ser um veiculo de emoções, paixões, desgostos e culutra, é um instrumento nas mãos dos que tem poder para lhe decidir o futuro. A música, a cultura, apenas acontecem, não param para pensar se é Património. Património é sinónimo de monetarização e usurpação.
PS: Na balada do V ano jurídico, os alunos estão a chorar porque é o final do curso para muito. Representa o final de uma fase. Do papel de estudante, que agora se lança à vida, ao mercado de trabalho. É como que um ritual de passagem. Depois da intensa convivencia que se opera em Coimbra, que inspirou Luís de Camões. E eu diria que 95% dos estudantes de Coimbra não ficam em Coimbra, deixando para trás amigos, companheiros, relações, etc...
Muuuuuito obrigado pela resposta mais do que completa. Acho impressionante (e me fascina muito) como a história cultural está constantemente atrelada a história socioeconômica e política. Digo isso porque aqui no Brasil ainda existem historiadores que permanecem querendo separa-las. O que considero precário para a produção histórica em si. Abraço e ficarei de olho em seus próximos posts!